6 de abril de 2012



Deus, onde te escondes?
Quanto busco um sinal de ti,
tua luz, tua palavra, tua presença.
Mas ouço apenas um sepulcral silêncio.
Seria tua morte ou tua indiferença?
Ou simplesmente foges de mim...
ou de tuas promessas?

Comigo um dia estiveste.
Indicaste-me o caminho a seguir.
Acaso pensas que não te reconheci?
Ando a buscar-te em pássaros e insetos,
crianças, velhos, moribundos, sãos,
na brisa, nas tempestades...

Jamais desistirei de ti.
Apresenta-te. Urge teu serviço.
Afasta ao menos rochedos impenetráveis,
árduos obstáculos, na estrada em que trilho.
É tua parte; de ti, basta um sopro, um gesto.
De mim, força dantesca seria exigida.
Ou planejas uma tal força
em mim?

Enlouquecestes?
Seria esta uma criação demoníaca.
Num comum mortal, o poder de Alighieri!?
Chega de criar! O mundo só precisa de reparos.
Também não te quero em mim... explodiria.
Quero-me em ti, dependendo de ti,
de tua sabedoria.

Apresenta-te, pois, e faze tua parte.

Morgana Gazel


(Esta poesia foi publicada pela CBJE, entre as melhores de 2009)

1 de abril de 2012

Criação Literária



Ao longo da elaboração do romance Enseada do Segredo, tive sonhos que eram verdadeiras aulas de criação literária e percebi que não deveria tentar mudar coisa alguma que a narradora que existe em mim trazia a minha mente. Se o fizesse, ela prontamente se escondia, e eu nada mais conseguia escrever. Essa tal narradora disputou ferozmente a escrita deste livro com minha personalidade normal, a que vivencia o dia a dia, tem filhos, netos, amigos, exerce a profissão de psicóloga, enfim a que “sou eu”. Ela, a narradora, apresentava as cenas, eu tentava alterar o que parecia em desacordo com o que conheço da psicologia humana, ela emudecia. Então resolvi escrever tudo o que viesse dessa subpersonalidade e usar minha lógica apenas na escolha do formato e na correção do texto. Para manter essa conduta, antes de começar a escrever eu dizia a mim mesma: “agora sou Morgana Gazel”, nome com o qual resolvi denominá-la.

Levando em conta essa dinâmica que ocorre comigo ao escrever ficção, fico a imaginar que em qualquer atividade criadora acessamos uma dimensão misteriosa, onde cenas, imagens, sons, concepções, pululam à semelhança do mundo das ideias de Platão. Gosto de pensar que nesta dimensão o Grande Artista toca sua música e a nós, sujeitos ao cogito cartesiano, cabe apenas dançar. Felizes daqueles que são capazes de soltar o corpo de modo a se deixar levar pelo ritmo e pela melodia.

Morgana Gazel



Nota: O "Enseada do Segredo" pode ser adquirido nas livrarias Saraiva e Cultura. Para compra online, clique numa das capas do Enseada, na coluna à direita.